Midiatização e redes digitais: os usos e as apropriações entre a dádiva e os mercados
A mediatização realiza uma ‘deslegitimação’ de
outros campos sociais na medida em que, agora,
estes não conseguem mais se subtrair ‘por distan-
ciamento’ do público geral, nem manter uma pro-
teção ‘esotérica’ para as lógicas ‘de campo’. ‘Tudo’
se expõe, logo tudo se torna aberto ao esquadri-
nhamento, se torna ‘familiar’ a todos (BRAGA,
2006, p. 14).
Os sujeitos, já permeados pelas lógicas midiáticas, não
se furtam a apresentar no espaço público suas opiniões. É nes-
sa esfera pública reconfigurada que as coisas acontecem, pois,
conforme Proulx (2012), a internet foi desenvolvida a partir da
concepção da cultura da contribuição, uma vez que, juntamente
com a nova tecnologia, surgiu também um dispositivo de comu-
nicação, chamado literalmente de ‘pedidos de comentários’, ou
o
Request for Comments
(RFC). “Através dessa lógica de ‘pedidos
de comentários’, os primeiros inventores do dispositivo da in-
ternet abriram desde o início um mundo livre” (PROULX, 2012,
p. 4).
Serge Proulx (2013) considera que contribuição so-
cial são as inúmeras atividades de interação na internet, mas,
para exemplificar, ele enumera o ato de “bloguear, trocar arqui-
vos digitais, postar no YouTube, retransmitir no Twitter, clicar
no jornalismo cidadão
online
. [...] podemos contribuir para re-
digir textos
online
, criar hyperlinks, organizar um conjunto de
documentos, publicar
online
, coisas assim” (PROULX, 2013). O
pesquisador destaca ainda a atividade de recomendação, isto
é, o ato de comentar se um restaurante deve ser visitado ou se
devemos ou não comprar um livro. Essas recomendações estão
assentadas na lógica da transação de mercado, mas também na
lógica do dom.
A noção de dom, no sentido de doação, foi tema de es-
tudos de Marcel Mauss (1991). A partir de trabalhos etnográfi-
cos realizados junto às populações afastadas dos grandes cen-
tros ocidentais, mais especificamente na região da Polinésia, o
pesquisador percebeu a existência de três obrigações que per-
tenciam a um mesmo complexo: dar, receber, dar por sua vez.
Em outra concepção, podemos entender a lógica do dom como