Midiatização e redes digitais: os usos e as apropriações entre a dádiva e os mercados
gar do objeto técnico na vida delas e como se apropriaram des-
ses objetos em sua existência. Quando crianças foram iniciadas
no mundo comunicacional com os videogames e, depois, en-
traram em contato com o computador, por exemplo, na escola
e depois em casa. E podemos, então, falar de uma trajetória de
apropriação; podemos fazer hipóteses sobre as relações de me-
ninos e meninas com a técnica e tentar observar em que medida
essas relações diferenciadas entre meninos e meninas podem
ter repercussões depois, quanto à natureza da apropriação dos
objetos técnicos durante a vida toda.
Abordaremos agora uma tipologia da definição da
noção de uso a partir da referência à obra de Philippe Breton
intitulada
A explosão da comunicação
. Publicamos uma quarta
edição dessa obra, em francês, em julho de 2012. Nela há um
capítulo inteiro sobre a questão dos usos. Podemos traçar um
contínuo de definições da noção de uso, que vai do consumo até
a apropriação, passando pelos usos, pela utilização. Em outras
palavras, quando falamos em uso e nos referimos apenas ao con-
sumo, estamos nos contentando com o fato de que um deter-
minado indivíduo comprou ou não um objeto. E é este gesto de
consumo que está na base das estatísticas de difusão. Dizemos,
por exemplo, que, em determinado país, foram comprados tan-
tos telefones móveis. Sabemos que, em vários países da Europa,
existem mais telefones móveis que pessoas. Observamos que
isso nos ajuda a produzir estatísticas, mas temos aí uma situa-
ção em que não se tem a informação sobre a própria natureza do
uso. Isso nos faz lembrar um colega, um professor, que disse há
alguns anos: “Eu vou passar à informática”; ele não tinha com-
putador e nos confirmou que depois comprou um computador.
Nossa reação foi dizer que ele estava sendo moderno. Dois me-
ses mais tarde, voltamos a encontrá-lo e perguntamos: “Como
vai, então, o seu processo de apropriação do computador?”. E ele
respondeu: “A caixa está ali e eu ainda não a abri”. Este é um
exemplo bobo, apenas para mostrar que podemos comprar e
não usar. O nosso gesto de compra é contabilizado em uma esta-
tística, mas podemos não fazer nada com esse objeto.
Fazemos uma distinção entre uso e utilização. Na utili-
zação, temos uma problemática mais funcional, uma problemá-
tica de face a face entre o indivíduo e o objeto técnico. Então, te-