Redes digitais: um mundo para os amadores.
Novas relações entre mediadores,
mediações e midiatizações
Em cada área, encontram-se tanto os autodidatas, os
especialistas, quanto os indivíduos que adquiriram suas com-
petências através da prática. Porém não há uma distinção radi-
cal entre conhecedores e ignorantes; nota-se mais a existência
de diferentes graus de conhecimento, entendendo que somen-
te quem se interessa pelo tópico irá participar da redação dos
verbetes. Na Wikipédia, todos os indivíduos são iguais e não po-
dem, no curso das discussões, arrogar-se de seus conhecimen-
tos especializados para encerrar o debate, mas devem sempre
argumentar. A multiplicidade das contribuições anônimas, como a
heterogeneidade dos redatores ativos, destaca a questão sobre a
unidade do projeto. Isso foi conquistado através de regras espe-
cíficas de governança: essas regras correspondem a um modelo
antiautoritário, que recusa o controle dos profissionais-especia-
listas. A vigilância sobre os artigos e as modificações é assegura-
da pelos próprios internautas. Tudo isso é possível porque o sis-
tema preserva a totalidade dos registros de correções efetuadas.
Há no centro da Wikipédia um princípio segundo o
qual todo participante detém uma parcela de conhecimento:
a mobilização dessa competência resultará numa melhora da
qualidade do verbete. É necessário, então, intensificar a coope-
ração. Criar e editar de modo colaborativo os verbetes exige um
modelo de iniciativas democráticas transparentes e controladas
por todos. Nesse sentido, a Wikipédia propõe uma elaboração
democrática de saberes normalizados.
3.7 O conhecimento cidadão
O conhecimento comum pode igualmente partici-
par do debate público, que necessita da “competência dos
incompetentes”
23
. Ele aparece mais usualmente nas situações de
grandes incertezas nas quais se pode temer um perigo para a saú-
de ou o meio ambiente, em que o problema não pode ser unica-
mente tratado por profissionais-especialistas, pois eles não têm
informações suficientes para elaborar previsões. Diante das incer-
tezas encontradas, percebe-se que as respostas possíveis derivam
23 RANCIERE, Jacques.
La Haine de la démocratie
. Paris: La Fabrique Éditions,
2005.