

Redes digitais: um mundo para os amadores. Novas relações entre mediadores, mediações e midiatizações
de toda a sociedade. Numa democracia de tipo representativo,
normalmente é o Parlamento que faz essas escolhas. Mas quan-
do os termos das escolhas não são tão claros, é necessário buscar
outras soluções para organizar o debate público
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. A assembleia
chamada de “consensual” é um caso típico. Ela é composta de 15
cidadãos voluntários que são escolhidos para representar a popu-
lação de todo o país e assegurar uma diversidade de opiniões. Eles
recebem durante alguns dias uma formação garantida por espe-
cialistas da área. Desse modo, os leigos tornam-se amadores. Em
seguida, eles questionam diferentes profissionais-especialistas
e os porta-vozes dos grupos envolvidos na controvérsia técnica.
Debatem longamente e, no final da assembleia, redigemuma série
de recomendações destinadas ao poder político que são tornadas
públicas. Essas assembleias e fóruns foram organizados a respei-
to dos transgênicos, dos rejeitos nucleares, da televigilância, etc.
Esses debates, geralmente organizados face a face, podem utilizar
a Internet em alguns estágios.
Esse dispositivo oferece muitas vantagens. De início,
ele retira o monopólio do debate dos profissionais-especialistas.
É certo que eles contribuem com elementos essenciais à discus-
são, mas não podem oferecer uma resposta pronta. Em segundo
lugar, o debate muda de natureza quando não é mais organizado
em torno de lobbies, os quais estão interessados diretamente no
assunto e desejam influenciar a decisão pública. Os membros
das assembleias cidadãs sabem diferenciar seus interesses pes-
soais daqueles das organizações políticas ou das associações a
que podem pertencer. Evita-se, assim, o confronto de posições
oficiais, rígidas, sustentadas pelo interesse dos atores e, por isso,
dificilmente alteráveis. Os participantes elaboram soluções ori-
ginais tomando como referência o interesse comum. Eles parti-
cipam da construção de um mundo compartilhado.
Enfim, essas assembleias mostram que o cidadão – na
condição de ser assim formado – tem a capacidade de tomar
para si debates técnicos complexos. Paradoxalmente, poder-se-
-ia dizer que quanto mais o tópico for complexo, mais a presença
dos amadores é necessária. Porque os especialistas, aqueles do-
24 CALLON, Michel; LASCOUMES, Pierre et al.
Agir dans un monde incertain
:
Essai sur la démocratie technique. Paris: Seuil, 2001.