Midiatização e redes digitais: os usos e as apropriações entre a dádiva e os mercados
uma doação, e sim uma obrigação de devolver o que é de Deus;
o crente fica como um depositário fiel de tudo aquilo que ga-
nha e deve repassar à igreja os 10%. O dinheiro, portanto, está
presente porque é uma forma atual de dar. Esta afirmativa não
difere da dádiva que Marcel Mauss (2013) refere entre os povos
da Melanésia e os indígenas da América do Norte, mostrando
que fatores econômicos são indissociáveis de outros aspectos
da vida social. Mauss esclarece que as trocas, sejam elas quais
forem, dizem respeito à sociedade no seu conjunto e derivam
todas da obrigação de dar. A dádiva sempre tem valor social,
reunindo ao mesmo tempo questões religiosas, econômicas,
políticas, matrimoniais e jurídicas (MAUSS, 2013, contracapa).
Dando continuidade às suas observações, acrescentemos tam-
bém a questão comunicacional e simbólica, pois a comunicação
não pode passar despercebida neste contexto, sendo imprescin-
dível para a significação completa. Podemos inferir que há uma
gestão simbólica comunicacional extensa regendo trocas simbó-
licas, uma riqueza de signos e símbolos que constroem e favo-
recem um intercâmbio entre o mundo imaginado e o material.
Tal complexo simbólico ajuda na construção comunicacional de
uma sociabilidade, e é o que Berger e Luckmann chamam de uni-
verso simbólico:
O universo simbólico também ordena a história.
Localiza todos os acontecimentos coletivos numa
unidade coerente, que inclui o passado, o presen-
te e o futuro. Com relação ao passado, estabelece
uma “memória” que é compartilhada por todos os
indivíduos socializados na coletividade. Em rela-
ção ao futuro, estabelece um quadro de referên-
cia comum para a projeção das ações individuais.
Assim, o universo simbólico liga os homens com
seus predecessores e seus sucessores numa tota-
lidade dotada de sentido, servindo para transcen-
der a finitude da existência individual e conferindo
um significado à morte individual. Todos os mem-
bros de uma sociedade podem agora conceber-se
como pertencendo a um universo que possui um
sentido, que existia antes de terem nascido e con-
tinuará a existir depois de morrerem. A comunida-