Operações de midiatização: das máscaras da convergência às críticas ao tecnodeterminismo
Descartar certa disciplina como “ultrapassada” significa imaginar
a constituição da realidade como atos que envolvem o conheci-
mento como coisa possível de se acumular de forma encadeada.
Para permitir esta visada, se deveria pensar um objeto como um
todo unitário, coordenado por um ponto de origem a partir do
qual seu desenvolvimento procede. Ao contrário, a arqueologia
supõe sua dispersão. Ao invés de algum encadeamento, entende-
-se a constituição de um objeto como consequência da conexão
entre elementos dosmais diversos. Ao se abandonar a tentativa de
identificar certo ponto original capaz de supor uma direção única,
abandona-se também a expectativa por algum destino final
2
.
Se, na constituição de um objeto, não se imagina que te-
nha sido descoberto pelas ações individuais de inventores, des-
cobridores ou exploradores; se não se supõe que decorra da ob-
servação progressiva capaz de revelar algo preexistente; se não
se o encara como o resultado de ummelhor entendimento sobre
a formulação de um problema anteriormente despercebido; se
estes objetos decorrem de transformações proporcionadas por
regras, como, então, estas regras atuam?
Já se sabe que a constituição de um objeto procede atra-
vés da diferenciação que lhe permite surgir e se delimitar. Neste
movimento, este objeto ocupa um lugar em relação a outros. Após
emergir, delimitar-se e especificar-se, vem a se dotar de particu-
laridade. Contudo, um objeto não preexiste à constituição de sua
positividade. Não se pode considerá-lo como um signo, algo sobre
o qual se fala. Nestes termos, o arqueólogo iria se ater a umdebate
sobre referentes e linguagem. Aqui, o objetivo reside em descons-
truir uma possível relação entre palavras e coisas, em prol de uma
opção distinta.
2
Levar a sério esta dispersão permite enfatizar as diversas associações das quais
o conhecimento depende. O exemplo da loucura é elucidativo. Sua constituição
como objeto envolve instâncias muito variadas. Relaciona-se à lei, à ciência, à
medicina, associando-se também a campos como a arte, dado o tipo de perso-
nalidade que tolera, entre outros. Na diversidade que pode organizar um objeto
pontual, percebem-se as rupturas e as descontinuidades. A constituição da lou-
cura decorre da possibilidade de diferenciar a razão da não razão, instituindo
uma diferenciação fundamental, anteriormente ausente. A ausência de distinção
entre ambas tornava a loucura algo carente de positividade e, em certo sentido,
inexistente. Esta unidade procede por uma regra, prática que unifica esta diver-
sidade, a partir de uma associação na qual, dada a pluralidade de elementos, não
se pode identificar uma gênese.