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Redes digitais: um mundo para os amadores.

Novas relações entre mediadores,

mediações e midiatizações

Como vimos, apenas 24 meses depois do surgimento

da

www

, os primeiros sinais da mudança do espírito do tempo a

que nossas sociedades estavam submetidas já eram observados,

processo que segue até os dias atuais. A rede mundial de com-

putadores gerou impactos não somente nas formas de impren-

sa, mas nas formas de vida. De acordo com Flichy, a construção

de um novo imaginário em torno desse espaço público, que à

época era inédito – a possibilidade de conexão de pessoas por

meio de computadores –, podia ser compreendida a partir de

duas chaves de leitura: 1)

utópica

e 2)

ideológica

. Em suma, no

que diz respeito à compreensão 1)

utópica

do fenômeno, a abor-

dagem leva em conta uma polarização do então novo tipo de so-

ciabilidade, em que a utopia seria uma alternativa à “realidade

concreta”. Dito de outra forma, as redes de pessoas formadas no

espaço on-line corresponderiam a uma “utopia” em contraponto

à realidade dura e “verdadeira” das relações sociais no ambien-

te off-line. No que se refere ao segundo ponto, a perspectiva 2)

ideológica

, a visão dada na ocasião também correspondia à ló-

gica binária, mas colocando como opção à “realidade concreta”

a mediação simbólica do que se imaginava ser o real. Com isso,

a ideia de “realidade concreta” seria abandonada do campo de

análise, de modo que os polos seriam formados, de um lado, pela

utopia

e, de outro, pela

ideologia

. A referência teórica do autor

para pensar a dialética

utopia-ideologia

vem de Paul Ricoeur,

que dividia ambas em três níveis de significação. À utopia havia

as seguintes proposições: 1° nível – fantasioso/louco; 2° nível –

alternativa ao poder; 3° nível – exploração possível. À ideologia,

as proposições eram: 1° nível – distorção de real; 2° nível – legi-

timação do poder; 3° nível – identidade.

Ainda recorrendo a Ricoeur, Flichy destaca que, para

avançarmos na compreensão desse espaço público digital que se

forma a um só tempo pelos usos e pela técnica, é preciso colocar

em tensão, a todo momento, as considerações utópicas e ideo-

lógicas. É desta forma que o sociólogo constrói seu modelo de

análise do imaginário técnico, como ele mesmo explica:

En definitive, la conviction de Ricœur «est que

nous sommes toujours pris dans cette oscillation

entre ideologie et utopie (...) nous devons essayer