Midiatização e redes digitais: os usos e as apropriações entre a dádiva e os mercados
de textos que são rearticulados, desprovidos de seus contextos
iniciais, ainda que mantenham suas indicialidades. Dito de outro
modo, mesmo que se trate de Martin Luther King, não há ex-
plicações sobre ele, sendo que as leituras feitas sobre sua his-
tória, seu papel são derivativas ou correferenciadas na própria
imagem já totemizada, por isto eleita para ser reinscrita. Esta
imagem tornada totem é aquela que, por diversos processos de
inscrições/reinscrições, quase sempre com a chancela jornalís-
tica, recebeu o direito de figurar para além do tempo dos fatos,
seja por valores-notícia, mas geralmente por valores sociais, de
crença, tema já discutido em Rosa (2012).
O que é importante observar a partir dos materiais
que integram o
corpus
deste artigo é que no videoclipe da banda
Thirty Seconds to Mars
há uma quebra proposital do eixo esquer-
da-direita de leitura, o que gera uma confusão mental: afinal, de
que lado está a guerra e, consequentemente, estamos nós? Tal
pergunta é a tônica do emaranhado de imagens fotojornalísti-
cas, vídeos jornalísticos e atores sociais que se intercalam às
cenas da banda numa simulação de
embedding
em campos de
guerra americanos. O espectador é colocado no
front
sem jamais
ter estado lá, mas experiencia a guerra de imagens. São imagens
já conhecidas, as totêmicas, que são convocadas e desprovidas
de seus contextos, sendo outros agregados apenas pelos textos
que direcionam a interpretação.
Já no vídeo amador sobre os protestos de junho de
2013, a música Cálice é escolhida na referência ao Cale-se e à
emblemática ditadura brasileira, a mesma ditadura que é figu-
rativizada por imagens argentinas ou talvez espanholas. O ape-
lo aos “brios” do país, feito com cartazes em punho e frases de
efeito, mobiliza os eixos da leitura imagética colocando a popu-
lação em ângulos de opressão e a polícia/poder público como o
opressor. Ao utilizar o discurso jornalístico e imagens já veicula-
das anteriormente com grande repercussão e totemizadas, são
chanceladas as construções de que o jovem politizou-se, saiu do
e foi às ruas. Entretanto, quais os motivos do “Cálice”
ou do Cale-se em 1973? Há um evidente esvaziamento da infor-
mação e um acionamento dos ícones como meras bandeiras na
tentativa de empoderar o discurso de agora com o “peso” simbó-
lico do discurso anterior.