Table of Contents Table of Contents
Previous Page  92 / 282 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 92 / 282 Next Page
Page Background

Midiatização e redes digitais: os usos e as apropriações entre a dádiva e os mercados

de textos que são rearticulados, desprovidos de seus contextos

iniciais, ainda que mantenham suas indicialidades. Dito de outro

modo, mesmo que se trate de Martin Luther King, não há ex-

plicações sobre ele, sendo que as leituras feitas sobre sua his-

tória, seu papel são derivativas ou correferenciadas na própria

imagem já totemizada, por isto eleita para ser reinscrita. Esta

imagem tornada totem é aquela que, por diversos processos de

inscrições/reinscrições, quase sempre com a chancela jornalís-

tica, recebeu o direito de figurar para além do tempo dos fatos,

seja por valores-notícia, mas geralmente por valores sociais, de

crença, tema já discutido em Rosa (2012).

O que é importante observar a partir dos materiais

que integram o

corpus

deste artigo é que no videoclipe da banda

Thirty Seconds to Mars

há uma quebra proposital do eixo esquer-

da-direita de leitura, o que gera uma confusão mental: afinal, de

que lado está a guerra e, consequentemente, estamos nós? Tal

pergunta é a tônica do emaranhado de imagens fotojornalísti-

cas, vídeos jornalísticos e atores sociais que se intercalam às

cenas da banda numa simulação de

embedding

em campos de

guerra americanos. O espectador é colocado no

front

sem jamais

ter estado lá, mas experiencia a guerra de imagens. São imagens

já conhecidas, as totêmicas, que são convocadas e desprovidas

de seus contextos, sendo outros agregados apenas pelos textos

que direcionam a interpretação.

Já no vídeo amador sobre os protestos de junho de

2013, a música Cálice é escolhida na referência ao Cale-se e à

emblemática ditadura brasileira, a mesma ditadura que é figu-

rativizada por imagens argentinas ou talvez espanholas. O ape-

lo aos “brios” do país, feito com cartazes em punho e frases de

efeito, mobiliza os eixos da leitura imagética colocando a popu-

lação em ângulos de opressão e a polícia/poder público como o

opressor. Ao utilizar o discurso jornalístico e imagens já veicula-

das anteriormente com grande repercussão e totemizadas, são

chanceladas as construções de que o jovem politizou-se, saiu do

Facebook

e foi às ruas. Entretanto, quais os motivos do “Cálice”

ou do Cale-se em 1973? Há um evidente esvaziamento da infor-

mação e um acionamento dos ícones como meras bandeiras na

tentativa de empoderar o discurso de agora com o “peso” simbó-

lico do discurso anterior.