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Midiatização e redes digitais: os usos e as apropriações entre a dádiva e os mercados

-bocas acalorados nas redes digitais e nas ruas, revelando mais

ainda um sentimento de insatisfação generalizada da população

brasileira, uma notável polarização e a incerteza a respeito das

decisões políticas e da situação econômica.

Neste sentido, os desdobramentos dos protestos de ju-

nho de 2013 e suas reverberações nos mostram que a noção de

“microrrevoluções midiatizadas” talvez não possa ser aplicada

aos conceitos revolucionários de substituição de um poder por

outro, mas possa ser vinculada a uma “microdisputa” (em alusão

ao conceito de “micropolítica” de Guattari e Rolnik, 1996) pela

apropriação dos “dispositivos midiáticos” (FERREIRA, 2006)

responsáveis pela construção social da própria realidade. Talvez

essas microdisputas sejam ainda experimentais no mundo todo,

e seu episódio no Brasil tenha sido apenas um de seus laborató-

rios. O que é patente é que os atores sociais, naquele momento,

passaram a operar sob lógicas de mídia, até mesmo porque os

“jogos midiáticos” não são mais objetos estranhos aos olhos dos

“nativos digitais”, antes pelo contrário, sua própria forma de ser

e agir no mundo passa a levar em consideração a midiatização.

Desta forma, quanto mais os atores passam a discernir a midia-

tização, menos a mídia tradicional atua como mediadora e mais

as formas políticas do século XX perdem seu poder de represen-

tação. A lógica do

peer-to-peer

passou a fazer parte do cotidiano

das pessoas, e as práticas sociais passaram a ser operadas por

ligações sociotécnicas através das redes telemáticas, configu-

rando o

zeitgeist

contemporâneo.

Nossas análises nos levam a propor que uma resistên-

cia global se (des)organiza e ganha força nas formas anônimas

do agir político vetorizado pelas mídias digitais, principalmen-

te na força simbólica de figuras como o ativista mascarado do

Black Bloc, nas máscaras adotadas pelo grupo Anonymous e até

mesmo na multidão de atores distribuídos pelas redes sociais

(impossíveis de serem “catalogados”). O anonimato funciona

como uma proteção ao poder de retaliação das organizações

contra aqueles que ousam, publicamente, desafiar o poder ins-

tituído, configurando, assim, a luta da “multitude contra o impé-

rio” (NEGRI, 1996). Além disto, tem sinalizado a busca por uma

multiplicidade de ideias que não poderia se traduzir em rostos

de líderes, a exemplo de experiências políticas passadas, pois