Midiatização e redes digitais: os usos e as apropriações entre a dádiva e os mercados
segundo caso descrito. Não chegamos tão longe a ponto de ques-
tionar o mercantilismo através das ações dos fãs – na verdade,
eles estariammais inclinados ao contrário, a manter a oferta co-
mercial de seus seriados favoritos –, mas sua expressão, indivi-
dual ou coletiva, é um elemento relevante para pensarmos em
organizações políticas mais complexas.
Considerações finais
Algumas perguntas ganham sentido ao se estudar essa
conjunção entre ficção e crítica social produzida pelo sujeito
contemporâneo. Longe da atribuição clássica da recepção silen-
ciosa, a interpretação da realidade segundo uma moral ficcional
parece não estar nem dentro, nem fora da lógica do mercado. Os
fã-clubes são uma cultura do século passado, mas não haviam
chegado a tal experiência com suas séries. Seria essa uma nova
forma de recepção na era das redes digitais?
Provavelmente outras séries a seguir encontrarão o
mesmo respaldo por parte de seus fãs. O movimento relacio-
nado a Harry Potter é sustentado por uma geração digital que
parece estar cada vez mais consciente de sua capacidade de
ação à medida que experimenta essas formas de expressão.
Provavelmente intervenções similares às que analisamos sejam
efêmeras, mas questionam de maneira criativa os valores da po-
lítica dominante.
O público dessas abordagens é limitado, restringin-
do-se àqueles que entendem um mínimo sobre a narrativa de
origem. O exemplo brasileiro parece menos preocupado com as
consequências de suas ações; possivelmente por isso, o humor
surge e torna a militância dos fãs descontraída. Já os programas
de alcance internacional da Harry Potter Alliance são um bom
modelo de atuação, mas, no limite, ela não passa de uma pági-
na que defende a cidadania a partir de apropriações livres do
enredo de Harry Potter. É preciso dizer, então, que as narrativas
que pretendem servir para uma visão política de mundo neces-
sitam possuir latentes temas afins, se não os fãs correm o risco
de fazer associações distanciadas e mesmo incompatíveis com
as narrativas de origem.